Vivemos dias que nos desafiam a conhecer melhor as fibras do nosso ser e a articular pensamentos e emoções sob o prisma de uma fragilidade talvez insuspeitada.
Será que aterrámos numa realidade que para muitos só existia em ficções, que não supúnhamos, realmente, que poderia ser um dia o nosso chão? Estamos a viver semanas que nos põem à prova, em que provavelmente irão revelar-se facetas próprias e alheias que escolheremos assumir ou integrar, ou rejeitar liminarmente. Não seremos @s mesm@s quando passar o tempo da pandemia e pudermos abraçar-nos de novo e tirar fotografias a apertarmo-nos uns contra os outros, como referia o papa Francisco. Oxalá aproveitemos esta oportunidade para adoptar outros estilos de vida, para estabelecer com os outros e com as coisas relações solidárias e não de dominação e ganância.
Esta experiência faz estremecer os alicerces das nossas seguranças e, por conseguinte, de algumas das convicções. Por isso, somos convocados «para um humilde exercício de meditação», como sugere Viriato Soromenho-Marques em “Duas pestes” (DN, 07mar.20), texto que conclui assim:
O covid-19 devolve-nos, sem maquilhagem, o rosto assustador da verdadeira peste do nosso tempo. A nossa servil e suicida adição ao encarniçado crescimento exponencial, que corrói os próprios ecossistemas de que depende a nossa sobrevivência como civilização! Que seja um vírus a ter sucesso onde todas as políticas públicas de ambiente e sustentabilidade têm falhado, levando a moderar o consumo, a produção, as viagens, o ritmo e a intensidade do trabalho, a colocar um freio numa “economia que mata” – na designação realista do Papa Francisco – só nos pode convocar para um humilde exercício de meditação.
Façamos com que esta inesperada circunstância crie em nós a vontade de uma humilde cumplicidade com Deus, no cuidar de todas as criaturas, e nos prepare para celebrar de modo especial a próxima Páscoa – Quaresma e quarentena até têm a mesma raiz. Como escreveu Luísa Ribeiro Ferreira, no 7Margens,
As situações de crise e de sofrimento também têm um reverso positivo – elas desafiam-nos e ajudam-nos a crescer. A consciencialização das nossas fragilidades não constituiu uma derrota, mas sim o primeiro passo para uma superação possível.